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quinta-feira, 12 de abril de 2018


E se um dia...?



Se a terra tremer com intensidade em Portugal, muitas casas não estarão protegidas. Sobretudo as mais antigas, localizadas em zonas de risco. Não é fácil encontrar uma seguradora que aceite fazer um seguro. É tempo de pensar em soluções.


Não é sequer preciso evocar 1755. Há datas mais recentes a recordar-nos de que Portugal é um país de risco sísmico. À memória colectiva vem o ano de 1969, quando um terramoto com urna magnitude de 8 na escala de Richter atingiu o Sul e a região de Lisboa, tendo provocado 13 mortos e avultados danos materiais. E, mais recentemente, em janeiro deste ano foram registados dois abalos em Arraiolos, o primeiro com magnitude de 4,9 é o segundo de 3,1, e um em Almodôvar, com a intensidade do último. 
Mas o problema não se reduz ás falhas da geologia. Em todo o país, muitas habitações foram construídas antes da primeira legislação antissismica nacional (1958). 
Na metade do território com maior probabilidade de a terra tremer, o Sul, a situação ganha contornos ainda mais preocupantes. Na zona da Grande Lisboa, por exemplo, 21% das casas são de construção anterior àquela data, segundo dados do Instituto Nacional de Estatística.

Falta proteção

Não há forma de evitar um sismo, mas é possível minimizar os prejuízos que um evento desta natureza pode provocar. A contratação de um seguro multirriscos-habitação com cobertura de fenómenos sísmicos garante o pagamento de danos na sequência de tremores de terra, erupções vulcânicas ou maremotos. Mas, em caso de imóveis antigos ou Iocalizados em zonas de risco elevado, como o Algarve ou os Açores, poderá ser difícil, talvez mesmo impossível, contratar esta cobertura. 
O baixo número de habitações em Portugal com cobertura de fenómenos sísmicos é prova desta dificuldade. 
De acordo com um estudo da Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (ASF), apenas 16% das casas com seguro têm a cobertura que indemniza na eventualidade de terramoto. 
Não só é difícil contratar a cobertura de fenómenos sísmicos, como é caro, sobretudo nas zonas de maior risco. Factor que também ajuda a explicar o reduzido número de habitações protegidas. O preço desta cobertura depende da zona sísmica onde se situa o imóvel, do ano de construção e do capital seguro. Quanto maior for a probabilidade de ocorrer um sismo na região onde se localiza a casa, mais oneroso se torna o seguro, mas também, mais necessário. 
Para efectuarem os cálculos, as seguradoras baseiam-se numa tabela que classifica cada concelho do país em função de cinco categorias de risco. Os Açores e o Algarve são as regiões a que corresponde o risco mais elevado e onde os consumidores estarão mais desprotegidos, por muitas seguradoras se recusarem mesmo a incluir esta cobertura no multirriscos-habitação.

Solução: fundo sísmico

Esteve quase para sair da gaveta, em 2010, mas é lá que ainda está o diploma que visava a criação de um sistema de cobertura das perdas decorrentes de fenómenos sísmicos que garantisse maior protecção a todos. 
Propunha-se um sistema tripartido, constituído por um fundo com património autónomo e sujeito à supervisão da ASF, pelas seguradoras e pelo Estado. A ideia era tornar obrigatória a cobertura de fenómenos sísmicos para as fracções destinadas a habitação (apenas o edifício, não o recheio) e que já estivessem cobertas por seguros de incêndio ou multirriscos. 
À semelhança do que existe para o seguro automóvel obrigatório, quando um consumidor tentasse contratar uma cobertura destas e deparasse com sucessivas respostas negativas por parte das seguradoras, deveria reunir três declarações de recusa e dirigir-se à entidade gestora do fundo, que nomearia uma dessas companhias para celebrar o contrato.
Havendo um sismo, seriam as seguradoras as responsáveis pela regularização de sinistros e pelo pagamento das indemnizações. 
Em primeiro lugar seriam utilizados os recursos financeiros do fundo sísmico e só no caso de se esgotar este capital é que as seguradoras seriam chamadas a intervir, suportando o valor remanescente. 
Ao Estado, por sua vez, caberia a reconstrução de equipamentos sociais e infraestruturas públicas destruídas com o sismo. 
Para que muitos consumidores possam ter acesso a uma cobertura essencial, é tempo de ressuscitar o fundo sísmico.

Texto de 10/04/2018, retirado do negócios.pt